segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Nós não sabemos respirar


Nós não sabemos respirar.

Exato!
A coisa mais básica para a sobrevivência - estamos fazendo de forma inadequada o tempo todo. O mais engraçado é que, quando bebês, nós fazemos corretamente. Os bebês respiram expandindo o abdome primeiro, depois enchendo os pulmões. O diafragma, como se espremendo uma bexiga, expulsa o ar de volta - e o ciclo se repete. Mas nós - adultos, responsáveis, com pensamentos complexos, ideias futurísticas, conquistas e prepotência intelectual - desaprendemos o mais básico da vida. Arrisco dizer que os bebês, neste quesito, estão mais evoluídos, qualitativamente, que a gente! Exagero? Pode até ser. Mas acho de um exagero muito pior a prepotência e desatenção que nós cultivamos perante a vida e a nós mesmos. E não estou falando de floreios - estou falando de respirar! O banal, o "nada a ver com isso", o automático - que, por ironia, é o mesmo que nos nutre a base da vida.

Respiramos errado o tempo todo, pra começo de conversa.
Arrisco dizer (de forma exagerada, novamente) que desaprendemos algo tão simples porque renegamos coisas simples. Criamos um arsenal de palavras para denotar coisas simples: mixaria, migalha, "coisa-pouca", "tiquinho", "coisinha", "trocinho"... A grandeza nos viciou! Enxergamos a muralha, não um conjunto de tijolos. Nossa Gestalt se fecha de forma gananciosa mundo afora, e só almejamos aquilo que parece estonteante, sem perceber que a grandeza é o que é devido a pequenice dos seus detalhes. Assim como é a pequenice da respiração. Já se imaginou sem ela? Mesmo no pior momento de qualquer vida, ela estava ali: fluente ou agitada, mas estava. E arrisco dizer (com o perdão do meu repetitivo exagero), que se ela não estivesse agitada, tais momentos nem teriam sido tão ruins. Mas quem se importa com isso? É algo tão pequeno, "nada a ver". "Que mané respiração - olha o que está acontecendo!". Ok... Olho o que está acontecendo... E ao olhar, percebo que seu abdome está que nem uma escola de samba. Por acaso ele está assim quando você dorme? É... Quem sabe a ambição de nossas ideias nos boicote tanto, pois estamos esquecendo que o básico não é inútil por ser básico. É base. E, sendo assim, sustenta tudo que vem depois. Tanto alegria quanto pavor. Tanto o caos quanto o adormecer. Está tudo aqui, em potencial. Vai acessar qual? Seja lá qual for sua resposta: não esqueça de respirar.

sábado, 17 de agosto de 2013

Lapidando...

Olha, não se ofenda. Não é por mal, nem por eu ser antissocial, depressivo, esquizofrênico... Nada disso. Nem vou cair naquela de "o problema sou eu e não você" - justamente porque não há problema. O que acontece, afinal, é que estou sendo meu melhor companheiro. Lapidando meus lados pontiagudos, lustrando meus lados ofuscados, jogando com os jogos que possuo... E estar sozinho é o protocolo básico para conseguir acessar a mim, vestindo minhas luvas de operário. Ser seu próprio lapidário é um trabalho lindo e sofrido - e por mais paradoxal que possa ser, aos poucos aprendo que estas duas palavrinhas não são opostas, mas complementares. Seja na mente, seja no corpo...
Enfim, também não vou me adentrar a complexidade dos
nós de pensamentos e justificativas pois, como já te falei, não é por mal, então de nada vale ficar divagando sobre isso... Já me basta a divagação mais importante, que está na mente deste que vos escreve - lapidando e sendo lapidada, ao mesmo tempo. Não leve a mal, mas aí já é um assunto somente meu!

 Man cannot remake himself without suffering, for he is both the marble and the sculptor. 

Carrel, Alexis 

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Destrave seu melhor instinto


Me inspirou a seguir o exemplo! Retirei do final de uma reportagem da Men's Health deste mês de Maio (2013), "Destrave seu lado selvagem". Um convite a reflexão e novos planos...

"Escrevi esta reportagem com papel e caneta, na sala da casa onde cresci, em Pittsburgh (EUA). Meu celular e o computador ficaram o tempo todo no andar de cima, junto com a TV. Se fico no quarto, não consigo sustentar um mesmo pensamento por mais de 30 segundos. Links, Facebook, SMS, canais para zapear, tudo isso se tornou um viciante - e entorpecente - tragadouro de tempo. E transforma meu cérebro numa papa. Por isso, tomei uma solução drástica. Só tem uma máquina na sala: um relógio de pêndulo quebrado. Não há telas para me tentar a trocar o real pelo virtual. A única vista é a da janela: uma encosta verde cheia de árvores. Comparadas com as distrações da web e da TV, as árvores podem parecer monótonas. Não é verdade. As mudanças delas são sutis e curativas: brotos verdes, raios de sol, gotas de orvalho. Tudo isso me deixa fascinado. O contraste entre o Windows e a janela é marcante. O primeiro apanha sua atenção com promessa de distração, mas perde o foco, exige demais do cérebro, e pode levá-lo ao colapso. Já a janela deixa a mente livre, dando a pausa necessária da labuta diária, e um descanso restaurador...
Ao nascer do sol, sou acordado pelo barulho de meus colegas de quarto. Dois rouxinóis que fizeram ninho no forro do telhado. De repente, ouço o som de voos acima de mim. Afasto o travesseiro dos olhos para ver melhor esse sujeitinho que escuto há meses, mas nunca vi. Ele entrou no cômodo por uma fresta no teto. Mas ficar dentro de casa não serve para o bicho. A ave faz círculos malucos, desesperada para achar uma saída. Abro a janela e vejo o pássaro passar como um raio. Indo lá para fora, onde é o lugar dele - e que deveria ser o seu também."

Jim Thornton

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Detalhe



As vezes uma sílaba muda o sentido de uma frase. Um simples acorde muda o tom de uma música. Não raro que uma pílula lhe saneie da doença. Quantas vezes uma mensagem no celular alegrou seu dia? Ou arruinou - e uma sílaba pode mudar de um para o outro.

Percebam que eu não falo de coisas grandes, pesadas, difíceis... São os detalhes pequenos, um rabisco feito as pressas naquele papel de rascunho, um gesto singelo - todos feito quase em anonimato - que nos passam do plano das ideias para a concretude das ações. Acredito muito que, qual trabalho de formiguinha, são nas coisas pequenas e simples que encontramos as soluções mais difíceis, e até mesmo a construção de algo que pode vir a ser grande e complexo. Não importa quão grande e poderoso um homem aparenta ser - um dia ele foi um bebê chorando por cuidado, como todos nós. Não importa o tamanho da muralha - um dia ela foi um tijolo e, antes mesmo deste tijolo, ela era apenas uma ideia do construtor.

Sempre há um grãozinho pioneiro, por maior que seja o castelo de areia! Ser simples, afinal, é a coisa mais grandiosa...

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Divagando sobre motivação


Bem, hoje estive lendo Viktor Frankl para uma prova que vai rolar mais tarde... Comecei a viajar e associar a leitura com um assunto que é muito comentado, mas de forma muito confusa, na minha opinião: motivação. Como sou muito ligado ao esporte, não pude deixar de puxar pra esse lado. Pra começar, posso dizer que aprendi (pela vivência, por leituras e por pessoas que conheci) uma coisa que é a lição número 1: motivação NÃO é a mesma coisa que vontade/desejo/empolgação.

A motivação surge na resposta dos porquês. Faz sentido eu dizer que a motivação surge justamente da falta de vontade? Vou explicar: o Fulano não tem vontade de sair da cama as 6h da manhã para ir a escola. Oras, a cama ta tri boa, parece que as cobertas estão abraçando ele, ta quentinha, lá fora tá frio, e bla bla bla. Vontade/desejo/empolgação de fazer aquilo, ele realmente não tem. Essa falta de vontade vai levar o Fulano a tão conhecida pergunta, que todos nós fazemos milhares de vezes: ‘’Pra que eu tenho que fazer isso?’’. Observem que “pra que?” é uma pergunta que busca por motivos. A palavra motivação deriva de “motivo” – razões, finalidades, objetivos, PRA QUÊS. Fica claro que motivação não é a mesma coisa que empolgação. A resposta do “pra que” é a motivação – por isso que eu digo que ela surge da falta de vontade, pois temos o costume de nos questionar sobre o sentido do que estamos fazendo somente quando isso nos tortura  a ponto de avaliarmos se realmente é este o caminho “certo” a seguir. Ok, pra que acordar as 6h da manhã e ir pra aula quando a cama está tão boa? A resposta que a pessoa dá a esta pergunta, juntas, formaram a motivação dela para fazer aquilo.

Infelizmente, temos culturalmente a tendência atribuir apenas motivações superficiais, materiais e financeiras para fazer as coisas, e acredito que é função disso que muitas das leis punitivas foram criadas, ao mesmo tempo que elas vão reforçando esta tendência. É a máxima: se o cara não tem motivação (e, logo, não vê sentido) naquilo que faz, que pelo menos ele o faça por medo da punição. A resposta neste tipo de situação geralmente são: “vou ficar pobre se eu não ir”, “vou rodar se eu faltar”. Observem o quanto a punição é realçada e posta como o motivo principal para fazer aquilo – é algo do tipo ‘’vou fazer porque se eu não fizer eu me fodo”.

Devo admitir que isso funciona e, de fato, não deixa de ser verdade. Então a pessoa levanta da cama e vai. Mas vai desgostosa da vida, sofrendo, resmungando, sem prazer, sem estímulos bons, sem vigor. Este tipo de motivação é profundamente destrutiva. São motivações baseadas em medo da punição. Por isso não existe vontade. Motivação é o conjunto de finalidades e razões pelas quais você faz tal coisa. Se estas motivações são meramente materiais e superficiais, você vai fazer isso de forma superficial.

Mas quando, ao contrario disso, você atribui motivações maiores a esta coisa, a vontade brota! Fico pensando até que ponto a falta de vontade não é causada por uma falta de motivações mais profundas. Claro que a vontade pode existir independente de motivações: “estou afim – não sei porque mas estou”. Talvez a vontade realmente não faça o menor sentido, mas está ali. Mas a questão forte, meus amigos, é que quando esta vontade anda junto com um arsenal de motivação não-superficiais, o ser humano conhece a força imensa que mora dentro de si o tempo todo, mesmo que as vezes saia torta, mau direcionada ou de forma obrigatória.

Fico pensando outra coisa: até que ponto aquele adolescente entediado em aula é “vagabundo e preguiçoso” (julgamento moral) ou que então está doente e passando por uma depressão ou déficit de atenção (patologização), ou ele simplesmente não está enxergando qual a moral de fazer aquilo? Será que ele, na verdade, tem apenas motivações superficiais para estar ali? E será que isso é culpa dele, ou simplesmente ele está incapaz de perceber a dimensão mais profunda das atividades que ele exerce? Será que parte da “culpa” não é das pessoas que obrigam ele a fazer sem antes justificar este fazer através de motivações intrínsecas nele?

Me lembro (ainda bem) de grandes professores que me disseram coisas do tipo “parece que você nunca vai usar estar fórmula matemática, mas fazendo ela você desenvolve um raciocínio lógico, uma capacidade de resolver dilemas, concentração, uma capacidade mental avançada, e isso vai te ajudar em todas as coisas que você gosta de fazer, mesmo que não tenha haver com matemática”. Isto com certeza me MOTIVOU muito mais a fazer qualquer exercício, mesmo os de bateria (que é algo que eu fazia por opção, mas mesmo assim eram chatos). Este tipo de resposta faz a pessoa ver sentido no que faz – elas propõem uma motivação maior. Este tipo de resposta é muito mais poderosa do que a clássica “porque isso vai cair na prova e se tu não souber, vai rodar”. Não quer dizer que eu tive orgasmos fazendo Báskara ou que eu acordava super-ultra-mega afim de fazer uma xarolha de 50 exercícios daquilo. Resumindo a obra, ter motivações, por mais que sejam profundas, não necessariamente vão te fazer ter vontade. Mas, vão fazer tu ver sentido em não atender cegamente a esta vontade que está ali.

Voltando ao esporte, fico MUITO indignado com o clichê pseudo-cientifico que diz que os praticantes de atividade física gostam disto porque são “viciados no efeito da endorfina”. Algo do tipo “ah, eles sentem prazer devido a liberação de endorfina, por isso que gostam de correr ou levantar pesos”. ALTO LÁ, COMPANHEIRO!

Tenho total convicção de que se provocarem clinicamente esta tal descarga de endorfina, a experiência desta pessoa JAMAIS terá a mesma grandeza que a prática daquele esporte. Por favor, não reduzam toda a complexidade deste fenômeno à ação de um simples neurotransmissor. Isto é simplista: e a última coisa que a ciência tem que ser é simplista. Quem pratica um esporte com afinco sabe: dói, esfola, é sofrido, é difícil de aderir e tem dias que tu quer simplesmente ver seriado comendo pizza como a maioria das pessoas fazem! Tu não tá 100% o tempo todo e muitas vezes a atividade física nem prazerosa é – é sofrida mesmo! Existem dias que estou na academia por total comprometimento, e não por que estou super-ultra-mega afim de treinar - e o mesmo vale para as aulas de Psicologia. O treino é sofrido: ao erguer um peso até a fadiga muscular, eu sinto é DOR, cara! O treino machuca, por isso que eu faço careta e grito: não é pra me aparecer, é porque DÓI! Cadê a tal da endorfina naquele exato momento em que o que eu mais quero (desejo/vontade/empolgação) é sair debaixo daquela barra e ir pra casa dormir??

Esta frase clichê com certeza vem de pessoas que sabem muito razoavelmente sobre o assunto, seja neurociência, psicologia ou esporte, e o pouco que sabem é simplesmente baseado em teorias, deduções e achismos. Quem VIVENCIA isto sabe que muitas vezes não é nada prazeroso e “endorfínico” estar engajado em um treinamento sério. E aí entra a tão comentada motivação – que, no caso de um sujeito engajado em um treinamento sério, que muitas vezes não é prazeroso e “endorfínico” – certamente ela não é superficial e materialista (no caso da musculação, simplesmente a estética), mas baseada em valores muito profundos, associações muito complexas, representações muito grandiosas. A endorfina é um detalhe miúdo no meio de todo esse verdadeiro ritual... Respeite, valorize e conheça antes de querer definir as coisas em uma única e simplista sentença.

Mas, como eu falei: quem tem o privilégio de unir uma grande vontade/desejo/empolgação com motivações (razões, porquês, finalidades) que não são meramente superficiais e materiais, sabe o poder que isso tem. Sabe que, atravessar o sofrimento rumo a um objetivo (que, ao mesmo tempo que é racional, é emocional), é uma síntese de todo o processo de crescimento que existe em nossa vida, profissional ou pessoal. Talvez estas reflexões lhes tragam um significado mais amplo para o famoso “No pain, no gain” e rompam com o preconceito do senso comum que o atleta é burro e troglodita.

E ainda tem gente que diz que Psicologia e Esporte não têm nada haver... tsc tsc.